Kero-Chan

Oneironautas [working title]

16 mensagens neste tópico

Okay, ando aqui a escrever umas coisas novas.. ;) como sempre. Ainda só tenho a ideia em bruto mas ando a treinar :) Por isso, aqui fica um pequeno teaser...

Dentro do quarto trinta e três do rés-do-chão do hospício Nicholas-Sebastien Chamfort estava Andrea. Não se lembrava do seu segundo nome. Para ser sincera, não se lembrava de muito para além do primeiro nome e de pedaços do que acontecera antes de ser internada graças às maravilhosas drogas que a obrigavam a enfardar. Tinha-se reconstruído, fabricado a partir do nada. Ao longo dos cinco longos anos, construíra para si mesma um novo eu, uma nova identidade, baseada nos pedaços que conservava ainda do que tinha sido (ou pelo menos acreditava ter sido) antes de o mundo desabar.

Não se lembrava de muito. Lembrava-se de estar em algum lugar que, ao longo dos anos, ou era uma estação de comboios ou a sua mente toldou a memória para que assim parecesse. Havia alguém - não sabia bem quem ao certo mas o seu pequeno coração contorcia-se de angústia e preocupação sempre que se lembrava. Era alguém de quem gostava imenso, isso era certo.

Dormia ainda enquanto, nos seus sonhos, os fragmentos de memórias passadas voltavam, lentamente. Estava só numa grande estação de comboios. Vigas intermináveis de aço subiam e arqueavam, sustentando um céu de vidro. Estava rodeada de gente e, mesmo assim, só. Só e fria até aparecer uma outra pessoa. Não sabia bem quem era nem que rosto tinha. Era uma presença que afastava o frio. Andrea sorriu e a presença sorriu com ela. Mas foi nesse momento que o mundo tremeu e abalou. Algo entrou ali, desfazendo o mais duro aço com simples sopros, esmagando e explodindo, devorando e consumindo.

O desespero que sentia era quase fisicamente doloroso. Os seus dedos fechavam-se em volta da frágil tecido, tentando conservar aquela pessoa, aquela presença, mas depois tudo se desvaneceu e também ela foi consumida. Nada mais restava.

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

Por isso mesmo se chama teaser... Se continuares posta aqui, porque, como de costume, o teu bom trabalho deixa-nos curiosos. Vê lá é se também não deixas este a meio! XD

Já agora, fazia um bom tempo que não te via por aqui... XD

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

yeah bro, posta mais ^^ nice e misterioso

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

Tenho andado a praticar o desenho :P Mas o primeiro capitulo dos Oneironautas está 90% concluído ;)

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

Okay.. sorry pelo duplo post, you know the drill :)

Aqui está o primeiro capítulo para os aficcionados de estórias mirabulantes.

Destrudo é a energia do impulso auto-destrutivo. É o antónimo de líbido. Enquanto o líbido é a necessidade de criar, destrudo é a necessidade de destruir, quer tu mesmo quer tudo à tua volta. É uma força de vida mais desconhecida e normalmente ignorada em prol de teorias sobre a emoção humana mais conhecidas.

Capítulo I

"Destrudo"

Tinham sido cinco anos. Cinco anos de pesadelos, de choques, de comprimidos e sangue por todos os poros. Mas, finalmente, estava livre.

O seu último dia no Hospício Nicholas-Sebastien Chamfort, em Imago, estava ainda para conhecer a alvorada. No negro da noite o silêncio era interrompido pelo monótono som de dedos num teclado de computador. A velha e arcaica máquina pulsava, irradiando o monitor como uma página de papel onde apareciam letras, depois frases e um texto. Parágrafo após parágrafo, a rotina seguia-se.

"21-13-1923

NSC-16661

A paciente Theta-3^3, admitida em 12-13-1918, demonstrou graves sintomas de esquizofrenia, negação, stress pós traumático acentuado por várias manias. O Impulso de Destrudo encontrava-se sete valores acima do libido, resultando em várias tentativas de suicido falhadas.

Foram-lhe administradas várias doses de sedativos, anti-depressivos e várias outras drogas experimentais (ver secção 67-B-EGO). Acções complementares de terapia de choque e modificação do Id seguiram-se. A paciente Theta-3^3 mostrou-se cada vez mais estável. Atingiu o valor 8 na escala de Eros-Thanatos no dia 21-12-1923 e, após o período obrigatório de 30 dias de observação pós-estável, está pronta a ser devolvida à sociedade.

Guardião Geral de Psiquiatria

Heligoi Ardesto "

O homem de meia idade suspirou enquanto deixava os seus dedos tocarem mais algumas teclas e a mensagem desaparecia, mostrando agora apenas a confirmação de que estava submetida aos arquivos.

"Theta três.." os seus lábios sibilaram e ele suspirou novamente. Nunca em tantos anos vira algo como aquela rapariga. Despegada da realidade, como se.. não estivesse ali. Caiu na insanidade tão depressa como se levantou. Ele não admitia perante os outros médicos mas ele tinha a impressão que todos aqueles remédios e terapias não tinham tido efeito nenhum. Fora tudo consequência de.. uma cura. Uma regeneração mental, por assim dizer. Como se a sanidade daquela rapariga tivesse ido de férias e voltado aos bocados, como vinho a encher um copo durante eras intermináveis.

Outro suspiro seguiu-se e ele passou as mãos pelo cabelo cinzento, grisalho da idade. Pegou nos óculos baços e limpou-os à gabardina branca, colocando-os de novo sob o nariz.

Levantou-se antes do sol nascer e já tinha saído do seu pequeno escritório quando os primeiros raios de sol começavam a iluminar as intermináveis pilhas de papel e pastas. A estas horas da manhã só os altos e fortes seguranças permaneciam, sentados nas pequenas cadeiras, a ler os amplos jornais. As cores dos corredores por onde passavam eram pálidas como se o tempo as tivesse gasto através da sua própria existência. Ajustou os óculos e continuou. O seu dedo no pequeno botão disparou um silvo de vapor algures, muito acima. O som corredio de metal e engrenagens, cada vez mais alto, anunciou a chegada do forte elevador de metal. As portas abriram-se para o interior cinzento e vazio.

Ela tinha sido recolocada no rés-do-chão, onde as janelas não tinham grades e eram feitas de vidro. Era o único andar assim no velho hospício, por razões óbvias de segurança. Outro silvo de vapor estancou o elevador e as portas abriram-se, deslizando sem um único som para os lados. O longo corredor ladeado de portas em que se encontrava agora ficava perto do átrio de entrada e a luz súbita da manhã fê-lo cerrar os olhos por momentos. Deu alguns passos e parou em frente ao quarto trinta e três. Bateu solenemente à porta e esperou por resposta.

Dentro do quarto trinta e três do rés-do-chão do hospício Nicholas-Sebastien Chamfort estava Andrea. Não se lembrava do seu segundo nome. Para ser sincera, não se lembrava de muito para além do primeiro nome e de pedaços do que acontecera antes de ser internada graças às maravilhosas drogas que a obrigavam a enfardar. Tinha-se reconstruído, fabricado a partir do nada. Ao longo dos cinco longos anos, construíra para si mesma um novo eu, uma nova identidade, baseada nos pedaços que conservava ainda do que tinha sido (ou pelo menos acreditava ter sido) antes de o mundo desabar.

Não se lembrava de muito. Lembrava-se de estar em algum lugar que, ao longo dos anos, ou era uma estação de comboios ou a sua mente toldou a memória para que assim parecesse. Havia alguém - não sabia bem quem ao certo mas o seu pequeno coração contorcia-se de angústia e preocupação sempre que se lembrava. Era alguém de quem gostava imenso, isso era certo.

Dormia ainda enquanto, nos seus sonhos, os fragmentos de memórias passadas voltavam, lentamente. Estava só numa grande estação de comboios. Vigas intermináveis de aço subiam e arqueavam, sustentando um céu de vidro. Estava rodeada de gente e, mesmo assim, só. Só e fria até aparecer uma outra pessoa. Não sabia bem quem era nem que rosto tinha. Era uma presença que afastava o frio. Andrea sorriu e a presença sorriu com ela. Mas foi nesse momento que o mundo tremeu e abalou. Algo entrou ali, desfazendo o mais duro aço com simples sopros, esmagando e explodindo, devorando e consumindo.

O desespero que sentia era quase fisicamente doloroso. Os seus dedos fechavam-se em volta da frágil tecido, tentando conservar aquela pessoa, aquela presença, mas depois tudo se desvaneceu e também ela foi consumida. Nada mais restava.

A voz do bom doutor acordou-a de um salto, os dedos enterrados no lençol, a almofada molhada de lágrimas. Recompôs-se e salto da cama. Colocou-se em frente do espelho e ajeitou as largas calças e a inofensiva camisa. Ambas ás riscas cinzentas sobre um branco monótono. A única coisa que dava cor ao pálido e mortiço quarto era os longos cabelos ruivos que tinha no topo da cabeça, de um vermelho quase sangue. Jovem, ruiva, atlética, mentalmente instável. Era ela.

Suspirou e mandou o médico entrar. A fechadura rodou e um silvo de vapor seguiu-se. A porta abriu-se e o médico de meia idade entrou. Fez o melhor por sorrir antes de se dirigir a Andrea. "Então, pronta para a vida lá fora?" Estes momentos eram sempre estranhos e Andrea não sabia bem porquê. Ela simplesmente deixou a cabeça pender antes de a levantar, acenando em sinal afirmativo. O médico olhou para as suas notas, escrevinhando mais um pouco. "Ora bem.." disse, deixando a frase morrer por momentos. "Assinas aqui e estás livre. A instituição dar-te-à roupas e algum dinheiro. Espero que te dês bem com.. a nova vida lá fora".

Este era um momento raro e estranho. Raramente alguém se curava realmente num hospício e o que fazer nesse caso fora, igualmente, raramente fora questionado.

Andrea suspirou e um pequeno sorriso apareceu nos seus lábios. Ela pegou na caneta que lhe era oferecida e assinou o único nome que sabia: Andrea. O doutor acenou com a cabeça antes de exasperar um solene "Muito bem.." e guiar a jovem até ao balcão no átrio de entrada. Lá, roupas normais - uma camisa, um par de botas, um par de calças e um casaco - foram dadas a Andrea assim como os objectos que ela tinha consigo quando fora internada. Não era muito: uma mão cheia de moedas, um pequeno diário e um relógio barato e industrial que não funcionava assim como uma pequena sacola negra.

Demorou-se pouco no seu quarto, para onde voltou brevemente para se vestir. Meteu o livro na sacola ao lado das moedas e colocou o relógio no pulso após desistir de o por a trabalhar. Não se lembrava do relógio mas isso não a surpreendeu.

O sol escondia-se já por detrás de densas nuvens quando finalmente saiu do hospício. De sandes na boca, sacola às costas e com uma infinita extensão de altos e negros edifícios com ainda maiores chaminés que vomitavam fumo negro para o já cinzento céu.

Imago, a segunda cidade do anel exterior de Köre, a capital desta cinzenta terra de fumo e metal, de argamassa, armações de aço e torres. Andrea agasalhou-se mal um trovão pálido cruzou as nuvens acima e uma chuva de água e cinza se seguiu.

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

Ta estranha, mas isso eh k m atrai nela, o seu misterioso tb me atrai, continua dude.

P.S: too much adjectives?

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais
Ta estranha' date=' mas isso é que m atrai nela, o seu misterioso também me atrai, continua dude.

P.S: too much adjectives?[/quote']

Much, n sei.. talvez "too many adjectives".

E não. Acho que a história, como está, já está demasiado seca e sem sal.. eu gosto de colocar mais emoção nas coisas e os adjectivos estão lá é para serem usados :P

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

Muito bom. Melhoras de cada vez que escreves algo novo... Tenta é não deixar as coisas por meio. Eu também tenho esse vício em muitas coisas, mas não é muito bom.

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

E, 11 dias depois.. xD O segundo capítulo!

Capitulo II

"Gestalt"

Duas semanas à deriva num mar de cinzas e a última nota ia para uma jarra de cerveja aguada em cuspo e sebo. Andrea não queria saber. Não tinha ambições a ideia do que fazer quando o dinheiro acabasse. No entanto, tinha acabado e parecia que arranjar emprego seria a única coisa que poderia fazer.

A taverna estava cheia. Cheia e imunda com uma névoa tabascal que inundava o ar, fazia as pálidas luzes eléctricas ainda mais fracas e contaminava os sentidos, tornando cada dentada na carne mais tenra num sorver de cinzas. E havia uma névoa em Imago. A cidade era como que repleta de uma neblina translúcida e pesada que entorpecia os sentidos e ia, lentamente, corroendo e desgastando tudo à sua volta.

Imago tinha esse efeito. Uma cidade perpétuamente numa penumbra. Os gases das altas torres fabris coroavam o céu de com um miasma industrial. O sol nunca brilhava, simplesmente havia luz. Uma luz pálida que anunciava o dia e a noite. Apenas o nascer e o pôr do sol se viam, quando o astro descia do limiar da negridão que cobria o céu. As pessoas andavam, para trás e para a frente, como berlindes sem inércia que andam e andam, de um lado para o outro, sem parar.

As ruas estavam sempre molhadas e escorregadias, as largas e gastas pedras de cobalto brilhavam à fraca luz do dia.

À noite, os candeeiros a gás iluminavam as ruas que agora se enchiam de pessoas cheias de vontade de deixar para trás o dia de trabalho a acartar o pesado carvão, a sofrer o doentio barulho das máquinas assim como o calor das chamas que lhes queimava a pele. Agora saiam, para as ruas silenciosas, e riam. Bebiam e contavam piadas porcas. Mulheres da vida proviam entretenimento aos sós e a cerveja e rum animavam a noite das tavernas.

Tinha os olhos presos nas diversas pequenas bonecas de trapos que pendiam do tecto. Os sorriso, cosidos a linha preta, eram eternos. Baloiçavam de um lado para o outro, enforcadas, os pés a tocar o topo do fumo que enchia o estabelecimento. Os seus olhos baixaram outra vez para a caneca, ainda cheia, e deixou-a lá. Escapuliu-se entre os vultos ébrios, para a brisa fria da noite. Mal saiu encostou-se à parede, agarrou o largo cano que descia dos telhados e esvaziou o conteúdo do seu estômago ali mesmo, o álcool diluído agora espalhado pelo cobalto.

Tossiu, o vapor formando uma leve névoa assim que saia do seus lábios. Mas assim que voltou a inspirar, notou o quão frio o ar era. Agasalhou-se, puxando o casaco de lã bem perto de si. Tresandava a álcool, não havia dúvida. E estava embriagada, sem dúvida também. Agarrou-se com força ao cano mas as mãos falharam-lhe e ela caiu no duro chão, grunhindo de dor. Que horas seriam? Quanto tempo passara desde que saíra do hospício? O que faria agora que tinha sido curada? Se é que fora uma cura o que lhe acontecera. Os olhos, já turvos, olhavam para os pequenos pontos brilhantes no céu. Estrelas, pensou. Estrelas no alto, no céu.

Desmaiou.

Era um sonho, ela sabia-o. No meio de um deserto, dunas altas e vento áspero. Era tudo o que a cercava até ao horizonte. Mesmo o horizonte era confuso, misturando a areia e o céu pálido, levemente azul onde o sol brilhava qual olho de um deus antigo.

Na infinita extensão de mar arenoso, a única coisa que existia era ela e uma plataforma. Conseguia vê-la, na distância, não muito longe. Era de pedra com um curto lance de escadas. Cinco degraus que davam acesso à plataforma em si. A Linha férrea corria como uma serpente até ao horizonte. Sentou-se na borda e acordou.

A luz fraca de uma vela dançava contra uma parede. A parede que via era amarela, como um canário, um amarelo doce, quase imperceptivelmente doce. A boca tinha um sabor a acre. O vómito, sem dúvida. Mas onde estava? Que sitio era aquele? Limpou o suor da testa e sentou-se, direita, na cama. Era uma cama pequena, para uma só pessoa, rente ao chão. O soalho era de madeira, conjuntos de tacos completavam padrão atrás de padrão. Reparou que estava possivelmente numa água furtada, as paredes convexas uniam-se num pequeno e alto tecto em jeito de torre. Levantou-se e dirigiu-se à única janela do pobre e poeirento quarto. Uma lufada de ar fresco bafejou-lhe a face e ela suspirou. Ali estava, bem alto, a ver o céu estrelado, negro como um mar onde as estrelas brilhavam, fracas e solitárias. E a lua, pálida mas viva, penetrando as fracas nuvens nocturnas enquanto não adensavam com o nascer do dia. À sua volta existiam altos telhados de escamas pétreas, azuis como o céu em volta da lua cheia. Torres negras que expeliam a fuligem durante o dia mostravam-se agora secas e silenciosas.

Ainda estava vestida. Isso era bom sinal. Mas um banho não lhe faria nada mal.

Foi enquanto pensava que a porta, pintada de um creme claro, se abriu e entrou um homem. Não era muito alto, mais baixo do que ela com certeza, mas era largo de ombros. Tinha cabelo negro levemente rebelde, um longo casaco de feltro cinza que lhe pendia dos ombros até aos pés e um par de calças e camisa tão negros que não lhes via distinção. Uma gravata azul, de um azul claro e calmante, quebrava o negrume. Tinha o nariz proeminente e os olhos negros brilhantes flamejavam à luz da vela.

"Ah, estás acordada." Ele disse, simplesmente, virando-se e fechando a porta. "Estavas num lindo estado. Enfim, não te posso culpar. É deste sitio."

Deste sitio? Antes de pensar em falar já as palavras lhe tinham saído, fracamente, entre os lábios. Voltou a dizê-lo. "Deste sitio? Imago?" As palavras saíram cristalinas, soando com um timbre quase inaudível no fim. Fê-la sentir como se acordasse. Aquele sentimento de frescura, quando os olhos lutam para se abrir, não fechar.

"Não, de todo este sítio. Deste... mundo se assim lhe quiseres chamar." Ele levou a mão ao bolso e de lá tirou um maço cinzento de cigarros. Bateu com ele uma vez na palma da mão e de lá tirou um único cigarro branco. Houve silêncio e o roçar da pedra no metal para fazer a faísca do isqueiro quase ecoou no quarto. Tinha um cheiro doce, activo e não passivo como tudo o resto no cinzento de Imago. Enquanto o fumo denso lhe subia pela cara, ele voltou a falar. "Cinco anos, não foi? É muito tempo para estar em Imago e ainda ser um individuo."

Individuo? Mas ele sabia quem ela era? Do que estava ele a falar?

"Andrea, tu não pertences aqui. Vieste aqui parar por engano e eu estou aqui para te guiar daqui para fora."

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

UHUUH Sinistro /o/ ta rox mesmo ^^

continua

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

Só agora arranjei tempo para ler o 2º capitulo ^^ muito bom, como de costume kero-chan :2thumbsup:

fico à espera do 3º capítulo ;)

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

Demorou mas aqui está o 3º Capitulo.

Capitulo III

"O Deserto"

Ele tinha-a seguido, à espera, nas sombras onde os olhos turvos da rapariga não o viam. Ela não o conseguia ver porque já estava há tempo a mais nesta cidade. Viu-a entrar no bar mal o sol se pôs e foi assim, encostado ao fundo do beco, de cigarro nos dedos, que esperou. Baforada após baforada, foi queimando os cigarros até ela surgir, cambaleante por entre uma torrente de música burlesca de dentro do bar - mais uma tasca que outra coisa qualquer mas, enfim.

Suspirou e deixou o último cigarro emudecer a brasa numa poça de água cinzenta. Assistiu enquanto Andrea vomitava todo o álcool barato e caía, voltada para as estrelas. Suspirou novamente e buscou, dentro do seu bolso, um novo cigarro. "De volta a tomar conta de crianças.. sinceramente. Estou velho demais para isto", resmungou enquanto segurava o cigarro entre os dentes, levantando a agora inconsciente Andrea.

E agora observava-a enquanto a sua mente entorpecida tentava fazer algum sentido de tudo o que lhe era explicado.

- E quem és tu? - exigiu Andrea, com cara de poucos amigos. Finalmente, a cabeça dela começava a funcionar.

- Queres um nome? Isso é fácil de dar.. ou queres saber quem eu sou? Isso também é complicado. Precisava de mais tempo para to explicar do que aquele que dispomos. No entanto, ruiva, chama-me Gabriel.

A face de Andrea ruborizou-se ao ser chamada de ruiva e foi rápida a reclamar.

- Eu não sou "ruiva", tenho nome, sou...- mas Gabriel interrompeu-a.

- Sim, eu sei que te chamas Andrea. - pausou e deu uma longa e sôfrega passa no cigarro antes de expelir o fumo pelas narinas como um dragão paciente.

- E o que queres dizer com "mais tempo do que aquele que dispomos"? Eu tenho todo o tempo do mundo.

- Na verdade.. - Gabriel puxou de um pequeno relógio de bolso, dourado. Abriu-o, fazendo a pequena máquina lançar um silvo de vapor - Temos cerca de meia hora para chegar à estação.

- E quem te disse que vou contigo?

- Vais comigo vais - disse ele enquanto guardava o relógio. - Eu sei onde ela está.

Esta frase gelou o coração à rapariga. Ela.. a palavra ecoou-lhe na mente como ondas num pequeno lago, reflectindo de volta memórias enterradas por debaixo de imensos areais de insanidade. Sentiu uma dor aguda nos joelhos. Tinha caído no soalho e cerrava agora os dentes em dor. Mas mesmo com os joelhos esfolados e a sangrar debaixo da ganga, sentiu-se contente. Via-lhe agora o rosto, doce e moreno, e o olhar infinito de amor e sabedoria. Foi algo que nunca lhe voltou a sair do coração.

Levantou-se de rompante, agarrando o colarinho de Gabriel com dedos nervosos. O tecido negro era suave e quase impossível de apreciar mas era resistente. A voz saiu-lhe rouca e bestial, num rosnar desesperado.

- Diz-me onde ela está!

Gabriel sorriu apenas.

- Farei mais que isso: levo-te a ela.

A voz do estranho homem tinha algo que soava a.. verdadeiro. O brancos nós dos dedos de Andrea voltaram a ficar rosados assim que os afrouxou. Gabriel sorriu condescendentemente, ajeitando a camisa, antes de acrescentar.

- Só tens de me seguir.

O ambiente era tenso entre os dois mas não hostil. Gabriel desapareceu por momentos antes de trazer um tabuleiro com um largo mas pouco fundo copo de leite e uma sandes de pão castanho com um pouco de carne salgada. Entregou-o a Andrea (que o consumiu rápida e vorazmente) e voltou novamente, após outra curta viagem fora do quarto, com um copo de café que ainda fumegava. Encostou-se à parede e o silêncio reinou enquanto cada um acabava a sua refeição. De vez em quando parecia que um deles ia falar. Andrea estava cheia de perguntas. Quem era Gabriel, como sabia onde ela estava, que interesse tinha. Suspirou, finalmente.

- Asase-chan...

- Tens saudades dela? - perguntou Gabriel que segurava agora a chávena vazia.

- Imensas... Asase Nymphalidae... a única coisa mais bela que o nome era ela mesma. - Suspirou novamente. Colocou o tabuleiro em cima da mesinha de cabeceira e deitou-se novamente na cama. Era confortável e morna e não demorou muito até que adormecesse.

Era já de manhã quando acordou. Gabriel estava ao lado da cama, a olhar para um céu azul e claro. Andrea estava espantada e levantou-se rapidamente, os olhos fitos num céu sem uma única nuvém, a brilhar radiante como uma placa celestial de lápis-lazuli. As torres. marcadas de carvão, estavam silenciosas e sem um único piu de fumo negro.

- Um belo dia para partir. Pronta para ir? Temos de apanhar um comboio. - anunciou Gabriel, afastando-se da janela e andando já para a porta.

Verdade seja dita, tudo o que tinha já trazia no corpo. Não gastou tempo a recolher pertences que não tinha e seguiu Gabriel.

Lá fora, as ruas estavam vazias. O chão pedregoso ecoava com os saltos e passos dos transeuntes, agora mais cinzentos do que nunca. O contraste do raro sol claro e a enegrecida cidade, húmida ainda de chuvas ou geadas, revelava um borrão que perdia cada vez mais definição enquanto se afastavam os dois.

Foi uma caminhada silenciosa. Gabriel andava calmamente, de mãos nos bolsos e um longo cigarro nos lábios. Andrea seguia-o, tropeçando em pedras irregulares e poças. Não demoraram muito a sair da cidade. Demoraram uma eternidade. Sempre em silêncio, sempre a passar pelas mesmas infindáveis ruas e prédios altos. Andrea pensava para si se havia mesmo algo fora de Imago.

Quando pensava que ia caminhar para sempre, uma luz forte e doirada bateu-lhe nos olhos ao mesmo tempo que os pés se enterravam meios em areia. Gabriel cobriu os olhos e suspirou.

- Aqui estamos. Finalmente fora de Imago!

Abrindo os olhos enquanto estes se ajustavam à luz forte, Andrea viu-se perante um infindável deserto de areia, secura e calor. O horizonte era difuso, o azul e o doirado unindo-se numa mescla de indefinição. Ainda espantada, seguiu Gabriel enquanto este se aventurava dunas fora. O basalto negro perdia-se debaixo da areia, cada vez mais e mais enquanto os dois se aventuravam pelas areias fora. Os prédios negros eram cada vez menos, mais pequenos, mais claros e enterrados até que as últimas torres fumegantes desapareceram debaixo de oásis secos e negros.

O calor era insuportável. Era um calor seco que se colava à língua. As brisas que sopravam era ainda mais quentes, queimando a pele e tornando o fresco suor em vapor.

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais

Lol... É impressionante, eu já li isto tudo, mas acabo sempre por me esquecer de postar.

Vai haver 4º capítulo? :P

Partilhar esta mensagem


Link para a mensagem
Partilhar nas redes sociais